O legado intelectual e humano de Charles Darwin é revolucionário. E, como todo legado revolucionário, sofre enormemente por barreiras do conservadorismo, e nesse caso específico, do fundamentalismo religioso.
Transcrevo uma breve matéria sobre os efeitos psicológicos e filosóficos da Teoria da Seleção Natural de Darwin, publicado no site do jornal O Estado de São Paulo.
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As ideias de Darwin ainda ‘assustam’
No bicentenário do naturalista, muitos ainda têm dúvidas sobre sua teoria, apesar das comprovações científicas
Herton Escobar, De O Estado de S. Paulo
SÃO PAULO - Se Charles Darwin estivesse vivo para comemorar seu aniversário de 200 anos, hoje, é provável que haveria protestos diante de sua casa. Pesquisas mostram que, mesmo com todas as evidências científicas acumuladas nos últimos 150 anos, desde a publicação de A Origem das Espécies, a aceitação de sua teoria da evolução por seleção natural ainda enfrenta dúvidas e angústias entre o grande público - principalmente no que diz respeito à evolução dos seres humanos.
"Para muitas pessoas, a ideia da seleção natural é simplesmente repugnante, ameaçadora, assustadora", disse ao Estado o filósofo americano Daniel Dennett, da Universidade Tufts, em Massachusetts. "Sem falar, é claro, que ela derruba qualquer argumento razoável que alguém já teve para a existência de Deus. Não surpreende que tanta gente esteja sedenta por evidências que questionem a teoria."
Dennett é, ao lado do britânico Richard Dawkins, um dos defensores mais ferrenhos do darwinismo e do ateísmo. Em 1995 ele publicou o livro A Perigosa Ideia de Darwin: a Evolução e os Significados da Vida. Agora, em 2009, diz ele, a teoria darwiniana - de que todos os seres vivos, incluindo o homem, evoluíram de um ancestral comum por mecanismos puramente biológicos de mutação e seleção - continua tão "perigosa" quanto em 1859.
"Além das motivações religiosas, há pessoas que interpretam a ideia de que somos ‘máquinas’ biológicas projetadas pela seleção natural para propagar genes como uma ameaça ao seu ego e à sua autonomia moral", diz Dennett. Segundo ele, porém, o fato de sermos produtos dos genes não significa que estejamos subordinados a eles. "Nossa autonomia é real, mas não é absoluta - nem tão misteriosa nem miraculosa. Ela evoluiu da mesma forma que nossos olhos e nossa memória. Nossa liberdade é um produto da evolução. Se as pessoas entendessem isso - algo que, admito, está longe de ser óbvio - elas não se sentiriam tão ameaçadas pela ideia de uma ciência materialista [no sentido filosófico do termo, não no senso comum] que explique a existência humana. Essa ciência não substituiria a ética, as artes ou as humanidades; ela seria sua fundação."
Mesmo na Inglaterra, o país de Darwin, uma pesquisa divulgada na semana passada mostra que metade das pessoas não acredita na teoria da evolução - ou, pelo menos, tem sérias dúvidas sobre ela. Os resultados incluem um gradiente de opiniões, polarizadas por aqueles que descartam completamente a evolução até aqueles que descartam completamente a existência de Deus.
O professor de sociologia Antônio Pierucci, da Universidade de São Paulo, diz que a rejeição a Darwin é compreensível e que a aceitação da origem evolutiva do homem deverá aumentar com o tempo. "Imagine como foi difícil para as pessoas, nos séculos 16 e 17, aceitarem que a Terra girava em torno do Sol", compara.
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É evidente que a Teoria da Seleção Natural e a Evolução Biológica não são decisivas a favor do ateísmo, como também é inegável que aponte para ele. O fato é que o devastador efeito da descoberta do naturalista britânico é um balde de água fria para o pensamento dogmático da religião. E o que surpreende é que, se o robusto empreendimento intelectual de Darwin ainda é um problema tão grande nesse aspecto, é sinal de que o dogmatismo religioso ainda está perigosamente presente entre nós.
Transcrevo uma breve matéria sobre os efeitos psicológicos e filosóficos da Teoria da Seleção Natural de Darwin, publicado no site do jornal O Estado de São Paulo.
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As ideias de Darwin ainda ‘assustam’
No bicentenário do naturalista, muitos ainda têm dúvidas sobre sua teoria, apesar das comprovações científicas
Herton Escobar, De O Estado de S. Paulo
SÃO PAULO - Se Charles Darwin estivesse vivo para comemorar seu aniversário de 200 anos, hoje, é provável que haveria protestos diante de sua casa. Pesquisas mostram que, mesmo com todas as evidências científicas acumuladas nos últimos 150 anos, desde a publicação de A Origem das Espécies, a aceitação de sua teoria da evolução por seleção natural ainda enfrenta dúvidas e angústias entre o grande público - principalmente no que diz respeito à evolução dos seres humanos.
"Para muitas pessoas, a ideia da seleção natural é simplesmente repugnante, ameaçadora, assustadora", disse ao Estado o filósofo americano Daniel Dennett, da Universidade Tufts, em Massachusetts. "Sem falar, é claro, que ela derruba qualquer argumento razoável que alguém já teve para a existência de Deus. Não surpreende que tanta gente esteja sedenta por evidências que questionem a teoria."
Dennett é, ao lado do britânico Richard Dawkins, um dos defensores mais ferrenhos do darwinismo e do ateísmo. Em 1995 ele publicou o livro A Perigosa Ideia de Darwin: a Evolução e os Significados da Vida. Agora, em 2009, diz ele, a teoria darwiniana - de que todos os seres vivos, incluindo o homem, evoluíram de um ancestral comum por mecanismos puramente biológicos de mutação e seleção - continua tão "perigosa" quanto em 1859.
"Além das motivações religiosas, há pessoas que interpretam a ideia de que somos ‘máquinas’ biológicas projetadas pela seleção natural para propagar genes como uma ameaça ao seu ego e à sua autonomia moral", diz Dennett. Segundo ele, porém, o fato de sermos produtos dos genes não significa que estejamos subordinados a eles. "Nossa autonomia é real, mas não é absoluta - nem tão misteriosa nem miraculosa. Ela evoluiu da mesma forma que nossos olhos e nossa memória. Nossa liberdade é um produto da evolução. Se as pessoas entendessem isso - algo que, admito, está longe de ser óbvio - elas não se sentiriam tão ameaçadas pela ideia de uma ciência materialista [no sentido filosófico do termo, não no senso comum] que explique a existência humana. Essa ciência não substituiria a ética, as artes ou as humanidades; ela seria sua fundação."
Mesmo na Inglaterra, o país de Darwin, uma pesquisa divulgada na semana passada mostra que metade das pessoas não acredita na teoria da evolução - ou, pelo menos, tem sérias dúvidas sobre ela. Os resultados incluem um gradiente de opiniões, polarizadas por aqueles que descartam completamente a evolução até aqueles que descartam completamente a existência de Deus.
O professor de sociologia Antônio Pierucci, da Universidade de São Paulo, diz que a rejeição a Darwin é compreensível e que a aceitação da origem evolutiva do homem deverá aumentar com o tempo. "Imagine como foi difícil para as pessoas, nos séculos 16 e 17, aceitarem que a Terra girava em torno do Sol", compara.
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É evidente que a Teoria da Seleção Natural e a Evolução Biológica não são decisivas a favor do ateísmo, como também é inegável que aponte para ele. O fato é que o devastador efeito da descoberta do naturalista britânico é um balde de água fria para o pensamento dogmático da religião. E o que surpreende é que, se o robusto empreendimento intelectual de Darwin ainda é um problema tão grande nesse aspecto, é sinal de que o dogmatismo religioso ainda está perigosamente presente entre nós.